O Lúpus Eritematoso Sistêmico é uma doença autoimune crônica e progressiva.
O Lúpus é uma doença que pode afetar diversos órgãos e sistemas com um quadro inflamatório persistente. O sintoma mais comum, e muitas vezes o primeiro, está relacionado à artrite.
O que é o Lúpus?
O Lúpus Eritematoso Sistêmico (que chamaremos somente de Lúpus daqui em diante) é uma doença desafiadora do ponto de vista clínico, porque envolve um número grande de variáveis e não há uma causa única que possa ser combatida.
O lúpus é uma doença inflamatória, crônica e progressiva, não contagiosa, com influência hereditária que afeta principalmente mulheres em idade reprodutiva (mulheres 9 : 1 homem) e com maior chance de desenvolvimento nas etnias de origem africana. Sua principal característica é a produção de auto-anticorpos, ou seja, o sistema imune identifica – equivocadamente – proteínas naturais do corpo como sendo estranhas e ativa o sistema de defesa no intuito de destruí-las.
Como consequência, surgem manchas vermelhas na pele nas regiões mais expostas ao sol (rosto, braços e peito), bem como em outros órgãos, causando sintomas genéricos como mal-estar, indisposição, dores de cabeça, fraqueza, perda de apetite e de peso, febre, dor nas articulações, gânglios inchados, problemas respiratórios, pressão alta e problemas nos rins.
Quais os sinais e sintomas do lúpus?
Por se tratar de uma doença sistêmica, as queixas dos pacientes variam bastante e envolvem diferentes sistemas do corpo:
1. Pele e mucosas
A alteração de pele mais comum é o surgimento de manchas vermelhas na pele (o eritema). Essas manchas costumam surgir nas áreas que ficam expostas ao Sol, podem ser levemente salientes, não doem e podem coçar discretamente. Talvez o sintoma mais conhecido popularmente seja o eritema malar, uma mancha em forma de borboleta que surge no rosto sobre o nariz e as bochechas.
Podem surgir lesões indolores em mucosas como céu da boca, gengivas, bochechas e interior do nariz.
Em momentos de exacerbação dos sintomas, nas crises, é possível que o paciente observe queda de cabelo localizada ou generalizada, que usualmente volta ao normal quando a doença está controlada.
Palmas das mãos, lateral dos dedos e ao redor das unhas podem apresentar manchas vermelho-escuras e inchaço
2. Articulações
Juntamente com as alterações de pele, problemas articulares são os sinais e sintomas mais comuns em pacientes com lúpus, afetando cerca de 90% das pessoas com a doença, mesmo em ausência de outros sintomas. Algumas vezes é o primeiro sintoma que aparece e pode permanecer isolado por anos.
As principais queixas são inchaço e dores articulares intensas que vêm e vão (artralgia) e a inflamação súbita de várias articulações em uma janela curta de tempo (mãos, ombros, cotovelos, joelhos e pés).
3. Sistema respiratório (pulmões)
Nossos pulmões possuem uma membrana que os envolve externamente que chamamos de pleura. Esta membrana pode ser afetada pelo lúpus e ficar inflamada (plerite). Como essa membrana se estica quando respiramos profundamente, é comum a queixa de dor ao respirar profundamente. Menos frequentemente, podemos observar inflamação do pulmão propriamente dito (pneumonite), cujo sintomas mais comuns são tosse seca e falta de ar de início lento.
4. Sistema circulatório (coração)
Da mesma forma como os pulmões possuem uma membrana protetora, o coração também possui. No caso do coração a membrana se chama pericárdio e também pode estar inflamada em pacientes com lúpus (pericardite), o que pode ocasionar dor torácica.
5. Sistema excretor (rins)
Todo o sangue do corpo é filtrado pelos rins, o que faz com que estes sejam órgãos muito vulneráveis a alterações sanguíneas. Como no lúpus o corpo produz auto-anticorpos que são carregados pelo sangue, os rins podem ser atingidos.
As consequências para os rins variam desde quase nenhuma, até insuficiência renal, por isso deve-se monitorar rotineiramente aquilo que possa afetar a saúde renal e os sintomas de seu mal funcionamento. O controle da pressão arterial, e exames de urina para detectar a presença de proteínas na urina são simples e necessários de realizar. O surgimento de inchaço persistente nas pernas deve ser imediatamente relatado ao médico.
6. Sistema hematopoiético (sangue)
O sangue é um tecido em que as células não estão conectadas como nos demais que constituem nossos corpos. São células livres que circulam pelos vasos e têm acesso a virtualmente todos os órgãos para atuarem no transporte de oxigênio e realizarem defesa contra microrganismos.
Como no lúpus há a produção de auto-anticorpos, alguns destes anticorpos podem atacar células sanguíneas e com isso observa-se redução na contagem dos glóbulos vermelhos (anemia), dos glóbulos brancos (leucopenia e linfopenia) e das plaquetas (plaquetopenia).
Qual a causa do lúpus?
O lúpus é uma doença multifatorial, mas hoje sabemos que há a interação entre genética e meio ambiente para seu aparecimento.
A influência genética é variada. Existem somente algumas poucas mutações genéticas de alto risco para o desenvolvimento da doença. O mais comum de se observar é a interação entre alguns fatores genéticos de baixo risco individual – em um universo de mais de uma centena deles.
Achado comum entre os pacientes é um tipo de anticorpo conhecido como anticorpo antinuclear (ANA/FAN). Este anticorpo não é exclusivo de pessoas com lúpus e tem um papel importante na remoção de células mortas dos tecidos, mas nestes pacientes parece que o mecanismo de destruição das células mortas está alterado de uma maneira muito peculiar (envolve processos com apoptose e fragmentação nuclear) que leva à autoimunidade.
Apesar de ainda não bem compreendidos, sabemos que existem fatores hormonais que contribuem para seu desenvolvimento. Basta observarmos o número muito maior de mulheres afetadas pela doença.
O meio ambiente influencia o aparecimento do lúpus. Há a hipótese na literatura médica de que um tipo muito comum de vírus da família do herpes, o vírus Epstein-Barr, possa induzir o insulto inicial para em pessoas com um perfil genético susceptível, entretanto, ainda não é claro qual mecanismo promove este gatilho, uma vez que mais de 90% da população mundial tem histórico de contato com o vírus Epstein-Barr, sem o desenvolvimento do lúpus. Adicionalmente, radiação ultravioleta, tabagismo e alguns medicamentos também podem ser gatilhos em algumas pessoas.
Como é feito o diagnóstico do lúpus?
Por se tratar de uma doença com grande número de variáveis envolvidas, o diagnóstico depende da detecção de sinais em um exame físico cuidadoso em associação com os sintomas relatados pelo paciente e seu histórico familiar.
Apesar de ser uma doença iminentemente do sistema imune, como as alterações articulares costumam aparecer precocemente é comum que o diagnóstico seja dado por um médico reumatologista, tanto que a Sociedade Brasileira de Reumatologia disponibiliza uma cartilha informativa para a população.
Finalmente, a estratégia diagnóstica vai variar de acordo com cada médico, mas para isso são adotados critérios internacionais que incluem:
- Mancha vermelha (eritema) em forma de borboleta na face, afetando nariz e bochechas;
- Eritemas discoides característicos de lúpus;
- Queda de cabelos;
- Úlceras indolores em mucosas (boca e nariz);
- Sinais de artrite;
- Dor no peito (angina) ou nos pulmões em respiração profunda;
- Presença de proteína na urina;
- Anemia;
- Leucopenia/Linfopenia;
- Plaquetopenia:
• Teste positivo para tipos específicos de anticorpos;
• Anticorpos antinucleares;
• Anticorpos contra DNA de cadeia dupla;
• Anticorpos contra antígeno de Smith;
• Anticorpos antifosfolipídio.
Lúpus tem cura?
O lúpus é uma doença crônica para a qual a ciência ainda não descobriu uma cura, no entanto, os tratamentos atuais permitem um bom prognóstico a longo prazo se a inflamação sistêmica se mantiver controlada, garantindo excelente qualidade de vida aos pacientes.
Eventualmente ocorrerão momentos de agravamento dos sintomas (exacerbações) entremeados em períodos de controle quase completo dos sintomas (remissões). As exacerbações podem ser deflagradas por eventos como exposição prolongada ao sol, infecções ou gravidez.
Por haver um forte efeito hormonal do decurso da doença, é esperado que mulheres pós-menopausa tenham menos exacerbações e períodos mais longos de remissão.
Como é feito o tratamento para o lúpus?
Não existe um tratamento único para o lúpus e por se tratar de uma doença crônica, há a necessidade de acompanhamento de longo prazo. Geralmente são usados medicamentos que variam de acordo com o momento da doença e os sistemas afetados. Além disso, é crucial a adequação do estilo de vida.
De maneira genérica para todos os pacientes é recomendada a utilização de barreiras protetoras contra a exposição solar ou outras fontes de luz ultravioleta para evitar complicações cutâneas. Como podem estar presentes complicações cardiovasculares, tudo o que for fator de risco cardiovascular deve ser observado, por isso é realizado o controle da pressão arterial, da glicose e dos lipídios no sangue(“colesterol”).
Os medicamentos mais utilizados são os anti-inflamatórios, mas tanto os do tipo não-hormonais quanto os corticosteroides devem ser utilizados com parcimônia para evitar efeitos colaterais perigosos. Especialmente nos casos em que é necessário o uso de corticosteroides, recomenda-se a suplementação com cálcio e vitamina D.
Outras drogas podem ser utilizadas durante o curso da doença a depender da avaliação de seu médico e essas incluem (a título ilustrativo de complexidade): antimaláricos, talidomida, dapsona, metotrexato, azatioprina, prednisona, esteroides androgênicos, ciclofosfamida, ciclosporina, gamaglobulina… e por aí vai.
Por causa de sua complexidade e do número de possibilidades de tratamento, o paciente com lúpus deve sentir-se acolhido pelo médico que o acompanha de forma a compreender as etapas do tratamento pelas quais terá que passar. Não é um tratamento trivial e há muitos casos de não adesão, o que costuma ser um complicador.
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